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domingo, 1 de dezembro de 2019

A “famosa gama 1€” ou a problemática do primeiro preço!


O Sr. Benjamin G. jovem retalhista, apaixonado pela sua profissão, e que conheci alguns anos atrás no decorrer de formações de organização do ponto de venda e de merchandising, organizadas pelo cash Malaquias e promovidas pela central de compra UniMark, enviou-me há poucos dias uma pergunta sobre a “famosa gama 1€”. 

Os subpontos da pergunta do Sr. Benjamin são os seguintes: 
- Até que ponto é importante no sortido de uma categoria? 
- Qual o nº de referências que esse tipo de produtos deve ter nas prateleiras? 
- Quais os cuidadosa  ter em termos de margem? 

Em primeiro lugar gostava de sublinhar que a problemática dos primeiros preços vem de longe e não está perto de acabar. No caso concreto do retalho independente, a tentação tem a ver com 2 elementos pesados: 
1-Muitos retalhistas independentes, com medo de perder clientes, tentam encontrar sempre produtos baratos e nesta perspetiva não se questionam sobre a qualidade do produto vendido desde que este seja barato. Se eles se preocupassem com a qualidade, provavelmente afastariam os produtos de primeiro preço que são de facto produtos de menor qualidade. 
2- Os retalhistas independentes têm carências em termos de gestão comercial e mais precisamente na gestão da margem dos produtos. Assim, quando aparece um fornecedor que propõe um produto já etiquetado com um preço de venda de 1€, muitos retalhistas ficam satisfeitos por não ter de fazer essa parte da gestão comercial dos preços. 

Em segundo lugar, gostava de lembrar aos retalhistas do retalho independente e associado que mesmo durante os momentos mais duros e penosos da crise económico-financeira que assolou Portugal, os primeiros preços não ultrapassaram em média os 4% das vendas, ou seja 96% das vendas foram feitas com as marcas e as MDD- Marca dos distribuidores. Eu lembro-me muito bem de acompanhar muitas lojas nesse período e de ver a seguinte articulação do mês, em termos de vendas nas lojas alimentares: 
De dia 1 a dia 15 do mês, as vendas eram feitas essencialmente com produtos de marca dos fornecedores e depois com MDD; 
De dia 16 a dia 27 do mês, as vendas eram feitas essencialmente com mais produtos de MDD e a seguir com marcas de fornecedores; 
Nos últimos dias do mês, quando o dinheiro era escasso nos lares, alguns dias antes de receber o ordenado, os consumidores compravam produtos de primeiro preço. 

Caro Benjamin, agora para responder mais precisamente às tuas perguntas. 

Até que ponto a gama 1€ é importante no sortido de uma categoria? 
Podemos reparar que a gama 1€ é sobretudo visível nas lojas dos retalhistas independentes, com certeza porque são alvos fáceis de convencer, segundo as razões que expliquei supra. 
Uma oferta de produtos a 1€ pode ser útil para responder às expetativas de preço dos clientes, mas neste caso é o retalhista que deve “construir” essa oferta. Assim os clientes podem ter um produto a um preço que acham apelativo e o retalhista pode controlar o seu nível de margem, ou seja a rentabilidade do produto. 
Em termos de sortido, a marca líder, em geral uma marca de fornecedor, representa a referência do mercado. A MDD, a marca do distribuidor, representa uma alternativa de preço menor para uma boa qualidade, ver uma qualidade similar à marca do fornecedor. Eu sublinho que, segundo os períodos, a MDD flutua em termos de qualidade. Hoje, estamos a viver um período onde sob o efeito concorrencial, as MDD “deslizam” em comparação com a qualidade das marcas líderes. Os primeiros preços representam apenas uma alternativa de preço, a qualidade intrínseca dos produtos sendo básica. Basta ler os ingredientes no rótulo dos produtos para perceber que o produto de 1º preço vale pouco! 

Qual o nº de referências que esse tipo de produtos deve ter nas prateleiras? 
Se se fala da gama etiquetada a 1€, eu diria poucas. A gama 1€ deveria ser limitada, como sendo apenas uma resposta às expetativas de preço barato de certos consumidores. Não é uma gama que fortalece o consumo nem a rentabilidade da atividade. 
Se se fala do segmento de produtos vendidos a 1€, diria que depende dos segmentos de produtos. Existe um conjunto de segmentos onde existem produtos vendidos a 1€. Benjamin, no teu mail, tu utilizaste o exemplo das bolachas e sabes bem que nessa categoria é muito fácil ter produtos vendidos a 1€, sem precisar de ter uma etiqueta de 1€ carimbada na embalagem. 

Quais os cuidados a ter em termos de margem? 
Os produtos da gama pré-etiquetada (carimbada) a 1€, são vendidos pelo vendedor com tendo 20% de margem. Todavia, o que valem esses 20%? São 20% sobre as compras ou sobre as vendas? Porque se for 20% sobre o preço de compra, isso quer dizer que são apenas 16,66% sobre o preço de venda. 16,66% sobre 1€ não dá para fazer uma festa! 
Os retalhistas devem perceber que eles devem definir, eles próprios, os preços de venda dos produtos que compõem o sortido da loja, e mais ninguém! 
No caso da gama 1€, não tenho dúvida de que quem controla a margem é o vendedor do produto e que o retalhista recupera apenas as migalhas. 
O que proponho 
Vou cingir-me às bolachas, mas os retalhistas podem alargar o raciocínio a outros segmentos de produtos. Contatei O Sr. Ricardo Malaquias, do cash Malaquias, de Ovar e perguntei-lhe qual era o preço de venda “grossista” aos retalhistas, das bolachas “wafers” a marca de distribuição Alteza
- O preço de venda do cash aos retalhistas é de 0,47€. 
- Para um PVC - produto vendido com Iva aos consumidores - a 1€, o Iva a 23% é de 18cts; 
- O Preço de venda sem Iva é de 0,82€ 
- Neste caso a margem em valor (€) para o retalhista é de 0,82-0,47=0,35€ 
Ou seja: 
- Uma margem sobre o preço de compra de (0,35/0,47) x 100 = 74,47% 
- Uma margem sobre o preço de venda de (0,35/0,82) x 100 = 42,68% 
Estamos longe dos 20% e dos 16,66%! 

Em conclusão 
Se para responder às características do seu mercado o retalhista deve ter uma oferta de produtos a 1€, a solução mais rentável é a de construir ele mesmo essa oferta. Como neste caso o produto não será pré-etiquetado (carimbado) a 1€, o retalhista deverá colocar stoppers na frente das prateleiras que tiverem esses tipos de produtos! 
Sublinho também que neste caso, além de garantir um nível de rentabilidade correto, o retalhista oferece aos seus clientes um produto com um nível de qualidade correto. 
O retalhista não deve deixar a outros a gestão da sua margem! 

Caro Benjamin, espero ter respondido à tua pergunta e fico aberto ao teu feedback. Boa reflexão e, bom trabalho. 

O seu sucesso está nas suas mãos! 
RB