Aproveitando a minha passagem na zona de
Ovar, no fim do dia de quarta-feira 20 de Novembro, encontrei o Sr. Ricardo
Malaquias; um encontro improvisado durante o qual falámos sobre um largo leque
de temas relacionados com o setor da distribuição.
Em
Portugal, onde se vive em aparência um momento de certa euforia em termos de
atividades económicas, o mundo da distribuição está a viver um momento bastante
incerto. Para o setor da distribuição, a euforia atual não consegue esconder as
turbulências profundas ligadas às evoluções sociológicas, às evoluções tecnológicas
e às pressões da concorrência.
Deixo aqui
a minha posição sobre vários temas.
O que devem temer os grossistas tradicionais do
setor alimentar nos tempos a vir?
O setor
grossista tradicional é hoje o elo mais frágil da cadeia de distribuição.
Frágil porque o mercado é controlado de forma esmagadora por cadeias retalhistas
de distribuição hegemónicas, e porque essas cadeias desenvolveram atividades conexas
de comerciantes retalhistas associados, abastecidos pelas suas centrais. O elo
grossista puro já não é imperativo.
O que pode
ser ainda mais aterrador do que a pressão dos grandes “players” da distribuição
retalhista é o desenvolvimento da pressão dos sobcontratantes. Os sobcontratantes
sendo as empresas como Amazon e Alibaba que, beneficiando de um acesso extraordinário
aos consumidores através de ferramentas tecnológicas avançadas, posicionam-se
sob as empresas e condicionam o seu acesso ao mercado a uma relação de vassalo/senhor.
Hoje
falamos de Amazon e da Alibaba por serem as empresas mais conhecidas no comércio
on-line mas, não há dúvidas de que haverá operadores nacionais cada vez mais
presentes neste segmento de atividade.
Será que a Mercadona é uma ameaça séria?
De fato, à
partida Mercadona é uma ameaça porque é mais um operador num mercado já bem
ocupado, complexo e hiperconcorrencial. Todavia, Mercadona cometeu erros dos
quais já falei em outros artigos. Conquistar um mercado não se limita a gastar
milhões de euros. A Mercadona está a provar mais uma vez a amargura de uma “expedição”
além das suas fronteiras naturais. “Veni, vidi, vici” não será para já! Vários
erros podiam ter sido evitados mas, por vezes o autismo do conquistador pode
ter consequências indesejadas!
O que dizer dos sobressaltos do comércio
urbano organizado?
A
concentração urbana em Portugal é uma realidade incontornável! Uma realidade
que levou as grandes insígnias que tinham completado o controlo da distribuição
periurbana a tentar entrar nos bairros, no coração das cidades. A ideia faz
sentido, mas um conjunto de obstáculos tem de ser ultrapassado tais como os
custos do metro quadrado do imobiliário que tornam pesado o investimento
inicial; os custos da logística, para amenizar o custo do último quilómetro; a
gestão da questão da amplitude horaria, que obriga a gerir vários turnos de
trabalhadores; a gestão do cabaz médio, tendo em conta que o consumidor urbano
compra pouco de cada vez; a gestão do sortido, porque por exemplo Lisboa tem
uma multidão de facetas em termos de segmento de residentes etc..
Em termos
do mercado urbano, a insígnia Pingo Doce tem uma vantagem séria sobre os seus concorrentes
e, do lado oposto do espectro, a insígnia My Auchan por exemplo parece não estar
a conseguir montar uma operação rentável. Pingo Doce
tem uma vantagem histórica e tem lojas bem inseridas nos centros urbanos.
Os
sobressaltos urbanos não vão parar amanhã, pois estamos a assistir à vontade de
empresas do comércio on-line de entrar no jogo do abastecimento diário dos
clientes. A Amazon é a mais conhecida a este nível, mas as empresas de “delivery”
querem também ocupar o espaço aberto pela evolução das empresas do Web e do impacto
que estas últimas tiveram no consumo; Uber é uma dessas empresas.
Neste contexto de grandes mudanças, como encarar
o futuro dos retalhistas independentes e associados?
O mercado
oferece oportunidades para qualquer fórmula comercial que saiba responder às exigências
e às expetativas dos consumidores. Portanto o retalho independente vai
continuar a existir, há indivíduos empreendedores que sabem analisar o mercado
e sentir as tendências. Lisboa viu, no decorrer dos últimos anos, o aparecimento
de novas lojas, posicionadas em nichos de mercado rentáveis. São sempre
projetos de jovens empresários cheios de vontade de ter sucesso!
As lojas
do retalho organizado em rede, como por exemplo a rede Aqui é Fresco, têm também com certeza o seu espaço no mercado.
Todavia, fujo ao pensamento único que defende um projeto e uma linha para todos
e penso que, para ter sucesso amanhã, as redes de retalhistas deverão basear-se
em bases comuns, constituídas por regras e normas partilhadas mas, com um leque
de declinações extremamente aberto para responder às especificidades dos micromercados,
e às expetativas dos retalhistas em termos de posicionamento. As ferramentas tecnológicas
tornam possível hoje o que ontem parecia impossível ou complicado de se fazer.
Espero que a exposição destes
temas dê a cada leitor matéria para refletir.
Boa
reflexão e, bom trabalho.
O seu sucesso está nas suas mãos!
RB
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