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quinta-feira, 24 de agosto de 2023

O caminho tão estreito dos grossistas tradicionais do setor alimentar

Nos centros urbanos, a loja ao lado onde fazemos as compras do dia-a-dia já não é a mercearia ou o minimercado do Sr. Manel ou da Dª Anabela. Não, são supermercados que pertencem a insígnias de grupos de distribuição de grande notoriedade. Os bairristas fazem as suas compras no bairro, perto de casa, como se tivesse sido sempre assim, no Continente, no Pingo Doce, na Auchan, no Lidl, no Intermarché, na Coviran. O rosto da distribuição em Portugal mudou e mudou muito, o retalho mudou e os grossistas do setor alimentar vão ter de mudar. 


O passado fica para a história, e apenas para a história 

As mudanças acontecem e fazem parte do andamento natural e inelutável do Mundo. O retalho alimentar mudou porque os consumidores estavam prontos a abraçar qualquer novidade que lhe permitisse fazer as suas compras mais facilmente, mais rapidamente, onde houvesse mais escolha e onde fosse possível passear à tarde de um sábado ou de um domingo. 

Nos anos 90 do século passado, muitos retalhistas acreditavam que os governantes não iam permitir o desenvolvimento de tantos hipermercados e de supermercados. E, muitos retalhistas situados em centro urbanos pensavam que “esses grupos” não tinham o conhecimento necessário para gerir lojas urbanas, nem para gerir a “difícil” sazonalidade algarvia. 

A história é assim feita de “dinossauros” que deixaram algures algumas pegadas e nada mais. 


A evolução do setor da distribuição deixou os grossistas no lugar dos “dinossauros”

A falar muitas vezes dos retalhistas que tiveram de evoluir ou de desaparecer, esquecemo-nos do segmento grossista e nomeadamente do setor grossista que durante tantos anos alimentou a ligação entre produtores, fornecedores e uma multidão de retalhistas dispersos, atomizados em todo o território Português. 

A drástica diminuição do número de retalhistas foi prejudicial à atividade grossista. Ficaram os mais sólidos, os grossistas que tinham adquirido uma grande notoriedade; mas para os sobreviventes a festa acabou há muitos anos, e no futuro não se espera bonança. 

Por vezes, ouve-se o lamento de um dono de cash que se lembra que se tivesse vendido o seu cash há algum tempo atrás teria ficado rico para o resto da vida, mas que hoje não só não pode vendê-lo, como sabe que o fim será no melhor dos casos o fecho do armazém e, no pior, a falência. 


Então, a única solução é desaparecer? 

Não necessariamente. O que desaparece é o que não se adapta. Existem caminhos que permitem encontrar uma saída. Nos 400 posts que escrevi na segunda década deste século existem pistas e orientações. 

As soluções possíveis são organizacionais, jurídicas, comerciais, de marketing, logísticas, tecnológicas, e humanas. 

Muitas coisas têm de ser postas na mesa e analisadas, descascadas, para fazer um novo modelo coerente com a atualidade. 


E como diz o ditado popular: A esperança é a última a morrer 

Num período crítico, a Makro Portugal soube encontrar o seu caminho, deixando de lado o retalho alimentar para se concentrar nas soluções que facilitam a vida dos profissionais da restauração, hotelaria e derivados. 

As insígnias líderes dos segmentos dos hipermercados e supermercados seguirão as expectativas dos consumidores que precisam de soluções alimentares, do tipo Pronto-a-comer ou pré-preparados. Aliás a Mercadona, está, segundo parece, a atrair bastantes clientes para o seu Pronto-a-comer. Daí as reações marketing da Continente e do Pingo Doce, orientadas nesse sentido. 

A plataforma Hiper Retail, start up em evolução, propõe um novo canal logístico que permite aos grossistas aumentarem as suas vendas, consolidando a sua posição nos seus territórios de base, e/ou buscando novos escoamentos nos territórios dos seus concorrentes. 

Para os grossistas, o esquema atual de “todos juntos” numa central é uma solução rota e sem fim honroso. O “todos juntos” deveria ser repensado. 


A consolidação e a concentração do setor da distribuição em Portugal, estão a estreitar o caminho de atuação dos grossistas tradicionais. 

Não são os anos bons meramente conjunturais, provocados pela Covid-19, que vão alterar qualquer coisa ao crescente empobrecimento do setor. 

Como se regozijar de uma situação totalmente artificial, e portanto independente do bom trabalho de seja quem for? Um golpe é um golpe, só acontece uma vez. 

Proclamar “somos 40% mais baratos” não é uma afirmação credível, e perder a credibilidade é provavelmente o pior que pode acontecer. 


Boa reflexão e bom trabalho, 

O seu futuro está nas suas mãos!









RB


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segunda-feira, 14 de agosto de 2023

A Inteligência Artificial vai ter impacto no retalho alimentar

O retalho alimentar é uma família de números. Ele é composto pela distribuição dita moderna, ela mesma subdividida em grupos do comércio integrado e grupos do comércio associado, e pela distribuição que gosta de ser chamada tradicional, constituída pelo retalho independente e associado em estrutura leves, ou seja com regras flexíveis e com poucas obrigações. Nessas duas componentes encontramos todas as fórmulas comerciais e todos os formatos, desde a mercearia de bairro até ao hipermercado. 

O mercado é um, e é o campo de jogo de todos os atores do retalho alimentar 

Para ganhar a confiança dos consumidores todos os atores da distribuição, independentemente da respetiva fórmula comercial, do formato ou da localização das suas lojas, devem entre outras coisas, responder às mesmas expetativas desses consumidores: A proximidade; o acolhimento e o atendimento do cliente; os horários de abertura; a seleção dos produtos vendidos baseada no consumo diário dos consumidores; o serviço complementar ou suplementar prestado aos clientes. 

A diferença fundamental não é e não será nem a fórmula comercial, nem o formato, nem a localização. 


É o tratamento da informação (a Data) que faz e fará a diferença entre os atores da distribuição 

Os grupos ditos da distribuição moderna acrescentam aos atributos gerais do comércio uma visão baseada na compreensão afinada das expetativas dos consumidores, através da recolha de uma multitude de informações sobre estes; ou seja sobre as pessoas que diariamente se deslocam às suas lojas. 

Assim, essas empresas gerem as suas lojas com um olho nas circunstâncias que caracterizam o mercado atual e um olho nas evoluções tecnológicas e técnicas que permitem otimizar a relação com os consumidores e, maximizar os lucros de cada centro de “profits” que são as lojas. 

Estamos a viver numa sociedade em que a tecnologia informática é omnipresente e trata de aumentar qualquer elemento/parâmetro que favoreça o negócio. Por exemplo, hoje em dia, a noção de proximidade não se limita à proximidade geográfica pois integra - além da loja física - as Apps e os sites das insígnias de distribuição. 

A IA (Inteligência Artificial) estará omnipresente em todas as atividades do comércio de amanhã 

A IA não vai destruir o Ser Humano, ainda não, até ser dotada de emoção e ser criativa, não vai haver perigo. 

A IA vai estar omnipresente no sector das compras, na gestão marketing, na gestão comercial, na gestão logística, nos recursos humanos. Nenhuma atividade será poupada. 

A IA permitirá um tratamento da informação como nunca houve em termos de velocidade, uma visão quase cabalística da redução das distâncias. Numerosos modelos de AI já existem e permitem revolucionar os fluxos de trabalho numa empresa. Adobe com a Sensei e o Firefly por exemplo já desenvolveu um saber fazer brutal nessa área. 

A IA generativa permitirá aliviar a realização de tarefas, pois dará uma resposta por exemplo à pergunta “Apresenta-me um folheto de brinquedos de Natal, por crianças entre os 8 e os 10 anos”, ou “Faz uma promoção orientada para os utilizadores do Facebook, ou do Tik-Tok ou da nossa App”, ou ainda “ Tendo em conta o fluxo de tal loja que nos pertence, qual seria a melhor organização laboral para oferecer o melhor serviço aos nossos clientes?” 

Mais, a IA generativa será uma ajuda brutal para as empresas e organizações que possuem uma ferramenta de IA interna; uma ferramenta que respeitará e terá em consideração a cultura da empresa, a forma de estar da empresa no mercado, o posicionamento da empresa, o plano marketing, os recursos disponíveis, as orientações a curto, médio e longo prazo, etc. 

Nem todas as empresas do comércio alimentar estão preparadas para o abanão que aí vem. E não será um “descontozito” que vai salvar alguém. 

Boa reflexão e bom trabalho, 

O seu futuro está nas suas mãos! 









RB

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domingo, 6 de agosto de 2023

Minipreço e o jogo da cadeira musical

A insígnia Minipreço está a sair do palco do sector da distribuição e Auchan aumenta a sua presença no mercado nacional português. O facto é marcante e mostra claramente um mercado em movimento, que tem como tendência a concentração da distribuição em Portugal entre as mãos de grandes “players”. 


Quem se lembra dos desaparecidos? 

Em 1994, há 30 anos, na classificação anual das insígnias feita pela revista especializada Distribuição hoje, cujo Diretor da redação da altura era o Sr. Francisco Filipe, apareciam insígnias tais como AC Santos e o grupo Europa. 

Eram insígnias Luso-portuguesas pioneiras no que se chamava já a distribuição moderna. 

Em 30 anos a hecatomba é impressionante; quem se lembra de AC Santos, Europa, Novo Mundo, Seleção, Sampedro, Polisuper, Horta, Alisuper, Marrachinho, etc. 

Parece - porque há polémica sobre a origem da citação - que Georges Clemenceau teria dito que “Os cemitérios estão cheios de pessoas insubstituíveis”. 

E de facto, estas insignias, líderes no passado, não fazem hoje falta a ninguém! 


Minipreço, um modelo de um outro tempo 

Minipreço conheceu horas de grandeza na viragem do século. Quem não conhecia Minipreço? Quando no fim dos anos 90 a insígnia Pingo Doce estava à procura de uma solução comercial para fazer viver as suas lojas, e que era vista - e com razão - como sendo uma cadeia de lojas caras, Minipreço tinha uma imagem de preços baixos, e de proximidade com os consumidores. 

Com o decorrer dos anos, Minipreço foi uma insígnia que demonstrou que: 

-uma política baseada num sortido estreito e pouco profundo e, nos preços baixos, não dava para alimentar a empresa; 

-basear o negócio na rotação acelerada dos produtos em loja urbana de média dimensão já tinha passado à história; 

-a ausência de parqueamento nas lojas urbanas era penalizador, porque os consumidores ficavam fisicamente limitados à quantidade de produtos possível de transportar num cabaz de compras; 

-e quando havia um parque de estacionamento, o sortido estreito e curto não permitia fazer sonhar o consumidor e seduzi-lo para comprar mais; 

-a falta de colaboradores nas caixas de pagamento provocava um estrangulamento, sobretudo no fim do dia, quando os consumidores precisavam de fazer as suas compras com rapidez; 

-o franchising de lojas alimentares não pode funcionar sem dar aos franchisados uma retribuição justa. 


Auchan vai ter de arregaçar as mangas 

Integrar perto de 500 lojas não será fácil e não se fará de um dia para o outro. A remodelação das lojas será uma obra grande, porque vai incluir: 

-uma redefinição do layout das lojas, aliás de cada loja, com uma complicação acrescida quando se tratar de lojas urbanas de rés-do-chão de prédio; 

-uma redefinição dos equipamentos que precisam de ser substituídos e/ou completados; 

-uma redefinição dos recursos humanos necessários e das formações necessárias, para incluir todas as lojas na família Auchan; 

-possivelmente, o fecho definitivo de lojas julgadas demasiado “fora do futuro” ou críticas para um negócio rentável futuro; 

-um acompanhamento do segmento “franchising”. 


O impacto sobre os outros “players” 

Esta integração vai relançar a concorrência direta com as insígnias que atuam nas zonas urbanas tais como Pingo Doce e Continente “Bom dia”. 

Mas também vai ter um impacto nas zonas interiores do país, para os aderentes do grupo Intermarché, os associados da Coviran e outras insígnias do comércio associado, que vão ver aparecer nas suas zonas de influência um “player” com mais força e um modelo de negócio mais sofisticado do que o Minipreço.

Os supermercados Minipreço com parque de estacionamento, e que até agora tinham poucos clientes, vão tornar-se competidores complicados para qualquer loja situada nas suas zonas de implantação. 

Na medida em que a tendência atual do mercado gira à volta da solução alimentar do dia-a-dia, é provável que a dinâmica e o saber fazer de Auchan aplicados a um vasto número de lojas, venham também a ter impacto ao nível dos “discounter” como Aldi, Lidl e Mercadona. 

Para o retalho independente ou associado de forma leve, como no caso da insígnia Aqui é Fresco, o impacto poderá ser severo e obrigar a uma redefinição da forma de gerir as lojas ou de animar as redes de lojas. Os retalhistas que conseguirem modernizar as suas lojas representarão o futuro da atividade grossista, mesmo se reduzida em número de “cashes and Carry”; enquanto os retalhistas bloqueados num passado que não voltará, levarão com eles os grossistas numa linha inexoravelmente descendente. 


Em 1994, o dono de uma insígnia citada no primeiro parágrafo, irritado, lançou-me à cara: “sabe com quem está a falar?” 

Respondi “sim Senhor, estou a falar como o Sr. X. (*) 

Diz-me ele: “Não, o senhor está a falar com o número 2 da distribuição Portuguesa!” 

Olhando para ele, retorqui: “fala de quando? Se calhar de ontem, porque hoje já não o é, e amanhã deixará de existir!”. 

O mercado está em movimento; é difícil inscrever-se nesse movimento de forma contínua mas é imperativo fazê-lo. 


Boa reflexão e bom trabalho, 

O seu futuro está nas suas mãos! 

(*) Depois desse primeiro contacto um pouco tenso, as relações com esse empresário foram sempre cordiais até ao fim da sua empresa e, no decorrer de um encontro anos mais tarde, confessou-me que o respeito que tinha por mim vinha do facto de eu ter sido o único a dizer-lhe de forma clara – e, se calhar de forma demasiada direta – que o caminho que ele estava a seguir ia levar a empresa contra a parede. Infelizmente foi de facto o final que conheceu essa empresa.










RB

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