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domingo, 6 de agosto de 2023

Minipreço e o jogo da cadeira musical

A insígnia Minipreço está a sair do palco do sector da distribuição e Auchan aumenta a sua presença no mercado nacional português. O facto é marcante e mostra claramente um mercado em movimento, que tem como tendência a concentração da distribuição em Portugal entre as mãos de grandes “players”. 


Quem se lembra dos desaparecidos? 

Em 1994, há 30 anos, na classificação anual das insígnias feita pela revista especializada Distribuição hoje, cujo Diretor da redação da altura era o Sr. Francisco Filipe, apareciam insígnias tais como AC Santos e o grupo Europa. 

Eram insígnias Luso-portuguesas pioneiras no que se chamava já a distribuição moderna. 

Em 30 anos a hecatomba é impressionante; quem se lembra de AC Santos, Europa, Novo Mundo, Seleção, Sampedro, Polisuper, Horta, Alisuper, Marrachinho, etc. 

Parece - porque há polémica sobre a origem da citação - que Georges Clemenceau teria dito que “Os cemitérios estão cheios de pessoas insubstituíveis”. 

E de facto, estas insignias, líderes no passado, não fazem hoje falta a ninguém! 


Minipreço, um modelo de um outro tempo 

Minipreço conheceu horas de grandeza na viragem do século. Quem não conhecia Minipreço? Quando no fim dos anos 90 a insígnia Pingo Doce estava à procura de uma solução comercial para fazer viver as suas lojas, e que era vista - e com razão - como sendo uma cadeia de lojas caras, Minipreço tinha uma imagem de preços baixos, e de proximidade com os consumidores. 

Com o decorrer dos anos, Minipreço foi uma insígnia que demonstrou que: 

-uma política baseada num sortido estreito e pouco profundo e, nos preços baixos, não dava para alimentar a empresa; 

-basear o negócio na rotação acelerada dos produtos em loja urbana de média dimensão já tinha passado à história; 

-a ausência de parqueamento nas lojas urbanas era penalizador, porque os consumidores ficavam fisicamente limitados à quantidade de produtos possível de transportar num cabaz de compras; 

-e quando havia um parque de estacionamento, o sortido estreito e curto não permitia fazer sonhar o consumidor e seduzi-lo para comprar mais; 

-a falta de colaboradores nas caixas de pagamento provocava um estrangulamento, sobretudo no fim do dia, quando os consumidores precisavam de fazer as suas compras com rapidez; 

-o franchising de lojas alimentares não pode funcionar sem dar aos franchisados uma retribuição justa. 


Auchan vai ter de arregaçar as mangas 

Integrar perto de 500 lojas não será fácil e não se fará de um dia para o outro. A remodelação das lojas será uma obra grande, porque vai incluir: 

-uma redefinição do layout das lojas, aliás de cada loja, com uma complicação acrescida quando se tratar de lojas urbanas de rés-do-chão de prédio; 

-uma redefinição dos equipamentos que precisam de ser substituídos e/ou completados; 

-uma redefinição dos recursos humanos necessários e das formações necessárias, para incluir todas as lojas na família Auchan; 

-possivelmente, o fecho definitivo de lojas julgadas demasiado “fora do futuro” ou críticas para um negócio rentável futuro; 

-um acompanhamento do segmento “franchising”. 


O impacto sobre os outros “players” 

Esta integração vai relançar a concorrência direta com as insígnias que atuam nas zonas urbanas tais como Pingo Doce e Continente “Bom dia”. 

Mas também vai ter um impacto nas zonas interiores do país, para os aderentes do grupo Intermarché, os associados da Coviran e outras insígnias do comércio associado, que vão ver aparecer nas suas zonas de influência um “player” com mais força e um modelo de negócio mais sofisticado do que o Minipreço.

Os supermercados Minipreço com parque de estacionamento, e que até agora tinham poucos clientes, vão tornar-se competidores complicados para qualquer loja situada nas suas zonas de implantação. 

Na medida em que a tendência atual do mercado gira à volta da solução alimentar do dia-a-dia, é provável que a dinâmica e o saber fazer de Auchan aplicados a um vasto número de lojas, venham também a ter impacto ao nível dos “discounter” como Aldi, Lidl e Mercadona. 

Para o retalho independente ou associado de forma leve, como no caso da insígnia Aqui é Fresco, o impacto poderá ser severo e obrigar a uma redefinição da forma de gerir as lojas ou de animar as redes de lojas. Os retalhistas que conseguirem modernizar as suas lojas representarão o futuro da atividade grossista, mesmo se reduzida em número de “cashes and Carry”; enquanto os retalhistas bloqueados num passado que não voltará, levarão com eles os grossistas numa linha inexoravelmente descendente. 


Em 1994, o dono de uma insígnia citada no primeiro parágrafo, irritado, lançou-me à cara: “sabe com quem está a falar?” 

Respondi “sim Senhor, estou a falar como o Sr. X. (*) 

Diz-me ele: “Não, o senhor está a falar com o número 2 da distribuição Portuguesa!” 

Olhando para ele, retorqui: “fala de quando? Se calhar de ontem, porque hoje já não o é, e amanhã deixará de existir!”. 

O mercado está em movimento; é difícil inscrever-se nesse movimento de forma contínua mas é imperativo fazê-lo. 


Boa reflexão e bom trabalho, 

O seu futuro está nas suas mãos! 

(*) Depois desse primeiro contacto um pouco tenso, as relações com esse empresário foram sempre cordiais até ao fim da sua empresa e, no decorrer de um encontro anos mais tarde, confessou-me que o respeito que tinha por mim vinha do facto de eu ter sido o único a dizer-lhe de forma clara – e, se calhar de forma demasiada direta – que o caminho que ele estava a seguir ia levar a empresa contra a parede. Infelizmente foi de facto o final que conheceu essa empresa.










RB

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