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domingo, 10 de fevereiro de 2019

O cliente escolhe quase sempre o original, em vez da cópia!

Recentemente, eu tive de me deslocar à Travessa Henrique Cardoso em Lisboa, uma rua perpendicular à Avenida de Roma, rua conhecida porque está lá situada a pizzaria Lucca. Em frente ao restaurante pizzaria há uma loja Meu Super, que conheço já há algum tempo. Já fazia 1 ano que não me tinha deslocado a esta rua e, fiquei espantado ao ver o declínio do supermercado Meu Super. 

A loja parece em declínio 
Percorrendo a loja, fiquei bastante surpreendido por diferentes aspetos: 
- A articulação da loja em termos de circuito e de distribuição das categorias pode ser muito criticada. Não entrarei em pormenores técnicos porque não quero fazer uma consultoria online; 
- A implantação dos produtos segue as deficiências constatadas no ponto precedente; 
- Até o sortido me pareceu aquém do que se poderia esperar de uma loja de rua, num bairro de forte movimento de moradores e de pessoas de passagem; 
- No fundo da loja, notei logo que a superfície tinha sido reduzida, um sinal claro que qualquer coisa estava a acontecer. 
Queria sublinhar que o nível de simpatia das pessoas que lá trabalham continua o mesmo; as pessoas que trabalham na loja e dão a cara aos clientes, colaboradoras e dona da loja, são amáveis e prestáveis. 

A vinda da loja Modelo Bom dia representou um golpe severo 
Na imagem infra, observa-se que a loja Modelo Bom Dia do Centro Comercial Acqua fica situada apenas à +/-380m da loja Meu Super. Numa cidade como Lisboa, a densidade populacional faz com que 300m de distância possam representar um afastamento suficiente para que 2 lojas possam viver bem. No entanto, parece que o início das dificuldades da loja Meu Super coincide com a vinda da loja Modelo Bom Dia. De forma isenta, eu entendo as 2 observações. Por um lado, é verdade que numa cidade como Lisboa, a densidade populacional permite a coexistência de várias lojas num raio de 380m e mesmo de menor distância mas, por outro lado, entendo que a vinda de uma loja Modelo Bom Dia tenha dado um forte abanão à loja Meu Super. 
Em geral, o individuo prefere o original à cópia! 
Posso entender a amargura da dona da loja Meu Super pois comprou uma ideia de sucesso, e vê o sonho desaparecer com a implementação de uma loja do mesmo grupo ao qual acha pertencer. Todavia, é fácil entender que uma Loja Meu Super representa apenas um “erzatz” de uma loja Modelo. 
Uma loja Modelo é um produto da “casa”, que beneficia dos investimentos que a “casa” pode proporcionar, e é portadora de um conjunto de elementos psicológicos fortes para os consumidores. 
Uma loja Meu Super é apenas um “enteado”, que satisfaz à falta de melhor. Uma loja Meu Super é, por razões de custos dos investimentos necessários para implementar uma loja moderna, limitada nas suas ações comerciais, marketing, Recursos Humanos…etc. 
O cliente, quando pode escolher, escolhe quase sempre o original em vez da cópia! 

A situação podia ter sido evitada? 
Se a ideia da dona da loja era encontrar uma estrutura do comércio associado forte e bem organizada, para garantir apoios técnicos na gestão da sua loja, ela podia ter contactado o grupo Intermarché ou a cooperativa Coviran para saber quais eram as respetivas condições de adesão. Teria beneficiado de apoios comerciais e marketing de muita boa qualidade e, teria preservado a sua independência relativa. 

Agora não sei quais foram as ações de apoio desencadeadas pela Sonae MC para apoiar a loja Meu Super da Travessa Henrique Cardoso. Em Lagos, a Loja Meu Super também parece estar com grandes dificuldades. Neste caso, pessoalmente, penso que o projeto estava condenado à nascença. 

Boa reflexão e bom trabalho, 
O seu sucesso está nas suas mãos! 
RB

domingo, 3 de fevereiro de 2019

Uma questão de escala

A distribuição alimentar tornou-se uma atividade em que a dimensão faz a diferença seja qual for o campo observado. As estruturas de dimensão intermediária, tais como as pequenas insígnias regionais, têm vocação a desaparecer. 

A escala faz a diferença
A dimensão de uma empresa de distribuição é um elemento fulcral para justificar os custos da logística, para absorver impactos financeiros ou para libertar meios para o marketing e o comercial. 
Como justificar uma base logística quando a insígnia possui apenas meia dúzia de lojas e às vezes ainda menos? 
Como conseguir condições de compra vantajosas quando o peso negocial se limita a alguns dezenas de milhões de euros de faturação anual? 
Como organizar uma campanha de comunicação que dê resultado com impacto forte e no tempo, quando o “budget” é por necessidade curto? 
Como dinamizar os recursos humanos da insígnia quando a política de expansão é quase ou completamente inexistente? 

A corrida à expansão é uma necessidade para os majores! 
Não é por o acaso que os majores da distribuição portuguesa andaram a multiplicar, numa primeira fase, as lojas de tipo Hipermercados e supermercados grandes e, numa segunda fase, lojas de tipo urbano; foi uma mera necessidade para cada um deles para ganhar a melhor penetração possível no país. A qualidade das negociações comerciais e a sobrevivência de cada grupo não deixam outras alternativas! 

Os comerciantes independentes competem com os grupos integrados 
O grupo Intermarché, grupo de comerciantes independentes associados, é o maior exemplo da resistência dos comerciantes independentes à forte pressão concorrencial dos grupos integrados como por exemplo a Sonae, Auchan ou Jerónimo Martins. Num registo mais reduzido mas louvável, a empresa Coviran, sobretudo posicionada no retalho alimentar de pequena e média dimensão, é um outro exemplo da resistência dos comerciantes independentes. Voltando ao caso da Intermarché, a mutualidade, que é a base do funcionamento do grupo, permite uma organização global extraordinária posta ao serviço de cada um dos associados. Esta organização permite uma logística poderosa, uma força negocial elevada, uma pressão marketing e comercial importante. 

Se as pequenas insígnias vão desaparecer, o que é que vai ficar?
As grandes insígnias que hoje são os majores da distribuição vão continuar a existir, com pequenas alterações possíveis na consequência de possíveis fusões ou de compra por outros grupos. 
Poderemos ver surgir novas insígnias, encostadas a grupos líderes do universo digital; Amazon, Alibaba e outros já mostraram as suas competências no setor do retalho alimentar. 
É possível que certas insígnias regionais de pequena expressão sejam compradas por operadores de maior dimensão, que quererão aumentar a sua presença regional. Todavia, as insígnias que outrora tiveram uma vida comercial extraordinária, mas que por incompetência e falta de visão dos seus dirigentes não conseguiram acompanhar as evoluções, que no entanto eram simples a implementar, vão desaparecer. 
O retalho independente vai continuar a existir porque corresponde à expressão de criador de empresa; pessoas que acreditam e têm fé nas suas opções e nas suas ideias. Esses retalhistas vão implementar novas fórmulas comerciais e farão as suas compras via novos canais e com novos operadores de fornecimento de mercadorias, que poderão ser diferentes dos grossistas tradicionais. 
Eu já tinha escrito no “post” O metrônomo, de 24 de Setembro de2017, que Caronte ia ter muito trabalho…e ele vai ter! 

Boa reflexão e bom trabalho, 
O seu sucesso está nas suas mãos! 
RB

domingo, 27 de janeiro de 2019

4 temas para sua reflexão


O apoio a domicílio dos idosos no interior do país 
No interior do país, em zonas de população envelhecida, as grandes insígnias de distribuição não são as únicas a estrangular o retalho tradicional de pequena dimensão, pois as empresas ou organizações de apoio dos idosos a domicílio representam uma concorrência suplementar em pleno desenvolvimento. Entre a concorrência de lojas organizadas e agradáveis que sabem gerir o tráfego de clientes e os serviços de apoio a domicílio dos idosos, é provável que o retalho alimentar tradicional de pequena dimensão sofra até desaparecer. 

Meu Super e a problemática urbana 
Como é que a Sonae vai gerir a problemática do confronto urbano entre as lojas Meu Super – insígnia de lojas em franchising- e as lojas Modelo Bom Dia – insígnia de lojas próprias que atuam no mesmo perímetro geográfico? Sabendo que no caso da rede em franchising é o franquiado que toma todos os riscos financeiros e portanto patrimoniais, não há um risco de conflito entre a Sonae e os franquiados? 
Seria interessante saber se os responsáveis da insígnia Meu Super estariam dispostos a assinar sem hesitações um contrato de franchising com a Meu Super, sabendo que amanhã podem apanhar nas redondezas a concorrência de uma loja Modelo Bom Dia! 

As MDD, um segmento incompreendido pelo setor tradicional 
Em numerosas lojas do retalho alimentar tradicional ainda é costume ver na mesma prateleira, lado a lado, 2 ou 3 produtos da marca do distribuidor. É um erro comercial porque isso fragmenta um segmento alternativo à marca líder e gera mais confusão na cabeça do cliente, sem trazer benefícios para a loja. É um erro em termos de gestão da prateleira, porque numa loja de pequena dimensão uma referência a mais provoca uma perda desnecessária de linear. É um erro em termos de gestão porque é mais uma linha de produtos a gerir, um stock maior que o retalhista deve financiar e um risco de quebra relativo à data de validade dos produtos. Neste “funesto joguinho” há 2 culpados: o retalhista que faz más opções comerciais e, o grossista, que além da MDD da central à qual pertence coloca muitas vezes a sua própria MDD no mercado. 

Os reformados do Norte da Europa em Portugal 
Nos últimos 4 anos falou-se bastante do impacto dos reformados dos países do Norte da Europa em Portugal e, nomeadamente, no Alojamento local e na nova dinâmica da construção civil. São 2 elementos que fizeram mais por Portugal do que as medidas do governo para melhorar o quotidiano dos portugueses. 
A primeira observação é relativa a uma dupla: encarecimento dos preços de arrendamento de quartos e restauração e, restabelecimento da ordem e de medidas de segurança nos países da Africa do Norte e do Médio Oriente. 2018 foi, segundo as informações comunicadas pela imprensa, um ano de reconquista do turismo para a Tunísia e o Egito. Portugal não vai perder a sua capacidade de atração mas vai ter de partilhar os turistas com outros destinos mais competitivos, quer em termos de custo de viagem quer em termos de custo da estadia. 
A segunda observação é relativa ao imobiliário. Os compradores de casas, vindos do Norte da Europa, reformaram-se recentemente e querem aproveitar os benefícios fiscais e uma boa vida num país pacífico e calmo. Mas, o envelhecimento também é sinónimo de início de problemas de saúde e, quando surgem problemas de ordem médica as pessoas preferem voltar ao seu país de origem em vez de ficarem hospitalizadas num país onde não falam a língua. É possível que nos próximos tempos possamos assistir à tendência de venda de casas dos proprietários da primeira onda de compradores. Seria uma operação de pegar na mais-valia realizada e de regresso ao país de origem. 
4 temas, para uma boa semana de reflexão! 
Boa reflexão e bom trabalho, 
O seu sucesso está nas suas mãos! 
RB

domingo, 20 de janeiro de 2019

Um outro olhar sobre o Universo da bricolagem


O que é a bricolagem? Será que esta palavra deve limitar-se apenas às áreas da canalização, da alvenaria, da eletricidade, da decoração? Ou será que numa visão moderna podemos incluir uma outra atividade, tal como cozinhar? 

Passo a passo, o retalho do setor da bricolagem modernizou-se 
No decorrer das últimas 3 décadas o imobiliário e a indústria audiovisual foram grandes ajudas para o setor da bricolagem pois o acesso às comodidades de uma casa moderna e aos filmes, às séries e outros programas de televisão, condicionou o gosto das pessoas e as suas opções de decoração. 

Mas, o modo de vida das pessoas está em constante evolução 
Podemos constatar que a tendência é à concentração urbana; as cidades são centros de atividades económicas e portanto são polos de atração das pessoas. As casas são muitas vezes apartamentos, que propõem um espaço limitado para os adeptos da bricolagem e a decoração não é uma coisa que se refaz cada ano. 

A cozinha seguiu as evoluções da vida das pessoas A cozinha, outrora uma divisão distinta da casa, passou a ser um espaço aberto sobre a sala de estar. Aliás, a cozinha está a tornar-se um espaço onde muitas vezes a comida não é preparada mas sim “assemblada”. Cozinhar de verdade está a mudar e a tornar-se uma atividade de partilha, de convívio entre familiares e/ou amigos. Podemos ver como os produtos étnicos penetraram os lineares dos supermercados. 

Cozinhar torna-se uma atividade de experiências culinárias partilhadas 
Desenvolver uma experiência culinária pressupõe: 
1-a vontade de partilhar um bom momento com outras pessoas, familiares ou amigos; 
2-ter os bons ingredientes, para obter os melhores resultados gustativos; 
3-ter as “boas ferramentas”, para cozer, moldar, enfeitar, apresentar o prato da experiência culinária. 

“In fine”, não seria nada descabido organizar uma zona de produtos – “ferramentas para cozinhar” nas lojas de bricolagem. Não tenho dúvidas de que seria mais um meio de criar tráfego nestas lojas da distribuição especializada. Aliás vejo como totalmente plausível, com a divulgação da tecnologia da impressão 3D, que haja no futuro muitos pedidos de formas, pratos, utensílios de cozinha específicos. 
Quem tiver criado em primeiro uma ligação com os consumidores nesta área moderna da bricolagem, terá uma séria vantagem sobre os seus concorrentes. 

Boa reflexão e bom trabalho, 
O seu sucesso está nas suas mãos! 
RB

domingo, 13 de janeiro de 2019

A escolha do freguês?


Dia 10 de Janeiro foi publicado na revista Hipersuper que na edição de 2019 dos prémios “Escolha do Consumidor”, os consumidores tinham eleito Auchan na categoria de super e hipermercados e, Meu Super na categoria dos supermercados de proximidade, entre outras escolhas. Uma boa noticia para uns e – imagino - uma interrogação sobre a atribuição dos prémios para muitos outros. 

A ausência de uma larga divulgação pública dos critérios de atribuição dos prémios “Escolha do Consumidor” pode gerar mal-estar 
A rotulagem “Escolha do consumidor” será utilizada pelos premiados para promoverem as suas lojas, os seus produtos, as suas ações marketing. Para um vencedor, tal como Meu Super, o prémio permite apresentar mais um argumento de peso para atrair futuros franchisados que podem hesitar entre duas insígnias. 
Seria interessante que fossem comunicados os critérios de atribuição dos prémios e, a classificação das Marcas/Insígnias concorrentes do mesmo segmento do mercado. Seria uma boa maneira de ajudar as insígnias concorrentes a melhorar os pontos nos quais elas terão tido uma pontuação aquém das outras competidoras. 

Neste sentido os profissionais do setor do retalho alimentar e os consumidores poderiam saber qual é a classificação das insígnias tais como Coviran, Amanhecer, Spar e Aqui é Fresco, que atuam no mesmo segmento que a insígnia Meu Super. 

Na ausência de clareza, os retalhistas independentes, já abalados para a própria evolução do mercado, podem sentir-se ainda mais isolados, abandonados e relegados para o último lugar do universo do retalho de proximidade. 
Também, a organização deste prémio pode ser suspeita de promover apenas o interesse dos grandes grupos. 

O que poderia ajudar a organização deste prémio, a ganhar mais credibilidade seria dar relevo, cá e lá, de Norte a Sul e de Leste a Oeste de Portugal, incluindo as Ilhas, a insígnias ou lojas independentes que através do empenho diário da sua equipa são campeões locais na categoria dos supermercados de proximidade
Boa reflexão e bom trabalho, 
O seu sucesso está nas suas mãos! 
RB

domingo, 6 de janeiro de 2019

Estamos a iniciar um Ano Novo …. Uma nova época de grande agitação!


Mais um! Poderá ser mais um do mesmo ou mais um diferente. Se for do mesmo vindo de uma situação caótica, 2019 será assustador. Mas se a trajetória vier ou for reorientada para a recuperação e as melhorias, 2019 deveria ser um ano promissor. 

As receitas de ontem dificilmente farão sucesso hoje 
As receitas de ontem foram criadas para responder a um mercado com certas características sociodemográficas, laborais, tecnológicas, científicas, etc., que não são as características de hoje e ainda menos de amanhã. 
Os processos têm de ser totalmente revistos, as ideias atualizadas. A produção mudou, introduzindo novos processos de fabricação, novas matérias primas, para responder às exigências novas do mercado. Os fornecedores adaptaram os seus modos operatórios ao aparecimento e à afirmação das centrais de compras e agora aos novos canais da economia digital.   
Os grossistas independentes e os retalhistas do comércio alimentar independente e associado não podem acreditar no regresso do Rei Dom Sebastião! As 3 últimas décadas demostraram que viver das conquistas passadas não travou o declínio de um comércio que conheceu no passado uma grande época de glória

As receitas têm de ser totalmente repensadas 
Redefinir as receitas tem de vir das pessoas, grossistas ou retalhistas, que vivem o comércio diariamente. Se a vontade de mudar não existe porque as pessoas não querem, não podem ou não compreendem, não há nada a fazer; a missa está dita! Perceber que as receitas devem ser repensadas exige muito dos patrões porque os obriga a “rebentar” com uma organização, uma estrutura, um modo operatório que passou à história. 
Nos anos 90, lembro-me de ouvir inúmeras vezes os retalhistas de Norte a Sul de Portugal explicarem-me que tinham tanta força que iam exigir do Presidente da câmara municipal que vetasse a abertura de grandes superfícies comerciais. Todos sabemos que em vez de querer vetar a vinda de concorrentes, os retalhistas deveriam ter mudados a forma de trabalhar as suas lojas. 
Lembro-me de ter tantas vezes alertado os grossistas sobre a necessidade de repensar a organização das suas empresas e de desenvolver uma rede de lojas próprias modernas, para poderem controlar o escoamento nas suas zonas de atuação de forma a combater a concorrência e a representar uma alternativa credível de escoamento para os fornecedores. 

Estamos a iniciar um Ano novo e faço votos para que a direção tomada tenha sido a boa. 
Boa reflexão e bom trabalho, 
O seu sucesso está nas suas mãos!
RB

domingo, 30 de dezembro de 2018

Os grossistas do setor alimentar encalhados entre uma sociedade algorítmica e um drama shakespeariano


O período de transição entre o fim e o início do ano é propício para fazer um ponto da situação. Aproveitando esse momento, queria abordar o universo grossista do setor alimentar e lançar alguns pontos de reflexão, pois esse setor de atividade está a viver momentos de grandes incertezas! Em quase 30 anos, o mercado mudou consideravelmente. 

Em 1993, se bem me lembro, existiam ainda perto de 44000 lojas do retalho alimentar. Os hipermercados eram tão poucos que as filas de espera nas caixas de pagamento eram longas. Insígnias como AC Santos, Europa, Novo Mundo, Polisuper, Sampedro faziam parte do panorama da revista profissional Distribuição Hoje. Intermarché tinha acabado de chegar, Lidl e Aldi, não estavam ainda a operar em Portugal, Pingo Doce era uma insígnia em plena transição, as lojas Continente independentemente da declinação da altura - eram poucas. Era um outro mundo, uma outra época, uma época em que o retalho independente contava. 
Hoje, as insígnias como AC Santos, Europa, Novo Mundo, Polisuper, Sampedro desapareceram, milhares de lojas independentes fecharam em todo o país e, o retalho independente deve contar aproximadamente 11000 lojas. Em 30 anos fecharam ¾ das lojas independentes. O retalho alimentar tornou-se uma atividade de grandes insígnias organizadas, estruturadas, integradas possuindo uma poderosa logística e uma força negocial incrível. Hoje qualquer cidadão português vive perto das insígnias Continente, Jumbo, Pingo Doce, Intermarché, Lidl, Minipreço. 
Na última década, a digitalização da economia, tendência que veio para ficar, ampliou as alterações profundas do mercado. A digitalização do comércio implica a gestão da Data - os dados do mercado, para que as empresas possam aproximar-se o mais possível dos consumidores. Estamos a viver na sociedade dos algoritmos que permitem processar a Data (os dados) como nunca foi possível e, num ápice! 

Obviamente essas evoluções do mercado tiveram, têm e terão consequências sobre a atividade grossista. 

Os grossistas estão numa encruzilhada 
Qual é perspetiva a médio e longo prazo dos grossistas “pure players”, sabendo que o mercado está a ver uma diminuição dos pontos de venda independentes? Pior ainda, qual é a perspetiva de crescimento da rentabilidade operacional quando vários grossistas partilham o abastecimento de lojas com uma faturação fraca, na ordem dos 4000€/6000€ mensais? 
Como imaginar um futuro promissor quando o mercado de atuação está numa fase de contração? Temos de concordar sobre um ponto: o grossista vive do escoamento do elo seguinte. Se o escoamento das lojas diminui ou deixa de existir porque a loja fecha, o grossista não pode sobreviver. 
Os grossistas do setor alimentar estão condenados a terem lojas próprias bem estruturadas, para proporcionar uma base de escoamento independente de terceiros. É o que fez a empresa grossista Emater situada na Ilha da Terceira, que nos anos 2000 revolucionou o seu modelo e passou a ter supermercados próprios que lhe asseguram um escoamento contínuo, de boa qualidade, e que lhe permitem assim confortar as suas capacidades de operador grossista. 
Para os grossistas aplica-se a ideia popular de que um infortúnio nunca vem só. Efetivamente, por um lado os grossistas assistiram à tomada do controlo do mercado por insígnias fortes e, por outro lado, assistiram, na última década, ao aparecimento de insígnias de proximidade como Meu Super, Coviran, Amanhecer, Spar …etc., que amplificam a subtração de pontos de escoamento potenciais. 

Os grossistas e o drama shakespeariano 
As dificuldades atuais de mudança de modelo de atuação dos grossistas tradicionais têm a ver com a história de cada empresa. Na origem, houve sempre um Homem excecional, trabalhador, cheio de vontade de empreender, sabendo tomar riscos e dotado de uma capacidade de liderança. Uma vida que força o respeito de toda a gente e em primeiro lugar dos herdeiros. O ponto crítico começa com a segunda geração, se esta for composta por mais do que uma criança. De facto, se os herdeiros forem pelo menos 2 pessoas, e que essas 2 pessoas tiverem por sua vez 2 crianças cada, em 2 gerações passamos de um criador da empresa a 4 herdeiros. É fácil perceber que se o criador da empresa tiver 3 crianças e que esses tiverem pelo menos 2 crianças, é preciso que a empresa cresça muito para assegurar um lugar a cada indivíduo da segunda geração, de forma a evitar problemas de liderança e de sucessão. É o drama shakespeariano! Para quem quer uma história mais digesta do que Hamlet, pode voltar a ver o Rei Leão para perceber o que é o drama shakespeariano. 
Para a maior parte das empresas grossistas independentes, é necessária uma reflexão para definir qual será o modelo empresarial que melhor pode garantir o futuro da empresa e dos herdeiros. Deixo infra um conjunto de links relativos a “posts” que escrevi no blog Alojadaminhrua no decorrer dos últimos anos. Podemos observar que, à nossa volta, as empresas de sucesso são de tipo S.A., modelo que permite uma gestão totalmente diferente dos recursos quando comparado com as empresas familiares. Esta situação é positiva para a empresa e os colaboradores que diariamente a fazem viver e, para os acionistas que representam os reais líderes da empresa. Os acionistas ficam na retaguarda e a direção executiva é entregue a um especialista.
No universo da distribuição alimentar, os anos vindouros vão ser extremamente dinâmicos e marcados por mudanças fortes. Às insígnias atuais que lideram a distribuição, teremos de acrescentar a vinda de outros operadores físicos tais como Mercadona mas também e possivelmente Costco e, uma maior pressão da parte dos operadores do digital. Desconheço que acordos foram assinados ou encaminhados no decorrer da visita do presidente chinês Xi JinPing mas, podemos razoavelmente pensar que no projeto da nova rota da seda tecida pelos chineses pode haver projetos que envolvam entidades como a JD.com. Para que o leitor possa refletir sobre o assunto, dou aqui o resumo dos elementos chave que caracterizam JD.com e que foram publicados na revista LSA Nº2518 de 23 de Agosto de 2018: 301,8 milhões de clientes ativos por ano, 500 armazéns dos quais 1 é totalmente automatizado e 15 são fortemente automatizados, 7000 estações de entrega, 99% da população chinesa está coberta pela sua rede logística, 90% das encomendas são entregues num prazo de 24 a 48 horas, 40 drones entregam diariamente produtos em 2 províncias rurais, 4 conceitos de lojas foram lançados desde o fim de 2017

Cuidado, cuidado, estamos a entrar numa zona de turbulências! 

Boa reflexão e bom trabalho, 
O seu sucesso está nas suas mãos!
RB